sábado, novembro 12, 2005

Capítulo VIII

Estou escrevendo um texto maior (acho que é um romance) e vou deixar um de seus capítulos para a galera ler.
VIII.

Retornei ao recinto domiciliar instantaneamente. Lá dentro, uma angustiante situação me esperava de volta. Pensei em contar a ela sobre Maria e sobre a falta que sentia dela. Quem sabe não iria embora! No entanto preferi não tocar no assunto depois que a vi.

Lena estava deitada em minha cama. Um lençol amarelado pela sujeira encobria seu corpo. De sua boca entreaberta escorria uma saliva clara manchando toda a fronha do meu travesseiro. Como poderia ter adormecido tão profundamente em tão pouco tempo? Bem, as dúvidas iam se esvaindo com uma natureza assombrosa.

Meus olhares foram arrebatados por cada pedaço daquela forma criada pela simbiose da matéria e da representação. Lena parecia meio mulher meio pano. E o que sentia por ela antes de sair de casa se transformara em algo meio nojo meio desejo.

Permiti que minha libido escorresse por sobre aquela figura misteriosa. Deixei-me ser sonho talvez sonhado. Tremi quando somente minha vontade mordeu o rabo em evidência de Lena. Transpirei minhas frustrações e absorvi o fantástico daquele momento uno.

Minha mente entrava em descompasso e os fragmentos da minha compreensão iam cada vez mais se distanciando uns dos outros. Senti um desejo enorme de ficar totalmente pelado. Tive vergonha de mim mesmo.

Descobri Lena, e toda sua nudez me fez mergulhar no mais profundo tesão. Meu pênis fez estufar minha bermuda. Meus pentelhos eram arrancados com a força brutal da ereção. Vigoroso, imponente, meu pau me fez pensar, agir, viver em função dele.

A cintura de Lena obrigou minhas mãos a segurá-la. Suas coxas queriam, por imposição, se misturarem as minhas. Seu dorso me parecia uma tela pronta para o labor de minha língua. A linha curva da coluna vertebral unia cóccix e pescoço e atestavam a impossibilidade de beijá-los ao mesmo tempo.

Seus olhos eclipsados me davam a impressão de prazer e satisfação. Deitei-me por sobre Lena. Pousei sobre ela todo o meu peso e minha proteção. Doei-me sem pedir nada, estava pronto para ela, assim como ela estava pronta para mim.

Algumas lágrimas fizeram do caminho por onde passaram um lugar frio. A falta de uma explicação para o choro fazia daquela situação ainda mais especial. Sussurrei em seu ouvido ‘eu te amo agora, eu te amo agora’. Fora desapertada, dentro de nós, a cumplicidade magnífica do sexo.

Não me deitei com Lena, mas com Maria... pecado?

quarta-feira, novembro 02, 2005

Montes

são tantos sonhos
tantos agentes
tantos atores
quantas forem as dores

são tantas entrelinhas
tantos entrelaces
tantas saídas
quantos forem os caminhos

são tantas marcas
tantas farsas
tantas farpas
quantas forem lembradas

são tantas pessoas
tantas personas
tão impessoais

são tantos desvios
são tantos deslizes
são tantos
somos dois
contra outros tantos
contra nossos tantos
tantos quanto forem

sábado, outubro 29, 2005

Mulher-manequim

Não quero saber se o tecido do teu vestido é o mais fino, da tua arma dura, da tua carapaça de cristal modelado. Não me importa o teu corpo erguido em saltos de inconstância, plena de ignorância. Nada valem teus bustos, glúteos firmes! O fiasco da forma encerrada em tom fosco. Não sucumbo ao apelo forçoso que deprecia o precioso por obsessão doentia.

Mulher, sê mulher!

Tempestade metafórica


Lá fora, o céu carregado ameaça tombar inteiro sobre a terra. As nuvens alvas assumem tons escuros e apagam a luz que iluminava, ou que cegava. O vento age apenas lá, no alto, deslocando as trevas de um lado a outro.

Aqui dentro, sobre um candelabro, uma vela, de chama pequena, insiste em resistir. A cada sopro maléfico, cambaleia, enfraquece, mas consegue se levantar. Um rascunho de vida desenhado em sua memória a mantém ainda acesa.

O céu desaba. Torrencialmente, o céu inteiro desaba. Gotas covardes se chocam vorazmente contra a terra e se dividem em milhões de outras gotas, até se unirem e formarem um imenso rio revolto. Uma sinfonia, um conjunto de vozes e sons.

De repente, a chama, assustada como nunca, percebe que do céu despencou a água que encheu o rio. Percebe que não sabe mais o que é céu e o que é rio. Então cambaleia mais uma vez pela incerteza que se coloca diante dela.

As nuvens agora disparam flashs que iluminam e cegam e inundam e emendam e assustam e machucam. A chama se apaga momentaneamente a cada flash. E o rio aumenta querendo chegar até o céu, de onde veio. A chama resiste e insiste ali no meio... entre o céu e o rio... no limite da existência
.